Dâmaso e Maria, namorados por sete décadas
Agência Estado - Os gestos e as palavras lembram jovens em início de namoro: ele diz "você está linda", ajeita os cabelos dela, e ela sorri fitando-o nos olhos com ternura. Três dias depois de realizar um sonho de 70 anos, os recém-casados Dâmaso Teixeira Bittencourt, de 103 anos, e Maria Coltrone, de 90, esbanjavam felicidade, na tarde de quinta-feira, na casa simples em que moram, no bairro Boqueirão, em Tatuí. "Somos apaixonados um pelo outro", afirmou ele.
A história de amor do casal centenário chamou a atenção dos moradores e muita gente os aplaudiu quando ele e ela, vestidos de branco, deixaram o cartório de registro civil, após a cerimônia. Não se tinha notícia de uma união civil tão tardia na região. Provando que, apesar da idade, ainda tem boa memória, o noivo repetia em casa as palavras ouvidas do juiz de paz Luiz Gonzaga Ferraz ao lembrar ao casal o compromisso de estarem juntos na alegria e na tristeza. "Agora é só na alegria, tristeza a gente deixa de lado", emendou.
Os dois mostram rara lucidez para a idade e muita disposição. Maria explicou por que chama Dâmaso de "Davi" desde que o conheceu. "Ele parecia o rei Davi da 'Bíblia' e, além disso, o nome verdadeiro é muito complicado."
Ao telefone
Entre um gracejo e outro, ressurge a incrível história de amor do casal. Maria tinha 14 anos e trabalhava como auxiliar de telefonista em São Paulo, onde nasceu, quando conheceu o futuro marido, no final dos anos 30. Ele era advogado do sindicato dos produtores de algodão do Estado. "Eu era menina, precisei adulterar meu documento para trabalhar. Ficava entre uma mesa e outra levando as chamadas anotadas num papel. Minha chefe me pedia para passar as cotações do algodão para o sindicato e todo dia eu falava com ele."
O namoro começou por telefone e só um ano depois eles se conheceram pessoalmente. Ela conta que Davi era casado e tinha um filho, embora não vivesse com a mulher, que morreu no ano seguinte. Depois que ele ficou viúvo, passaram a morar juntos e tiveram o filho, Maurício, hoje com 58 anos. A dificuldade em conseguir documentos da ex-mulher dele foi adiando o casamento.
Discreto, Bittencourt não gosta de falar do passado, mas a mulher conta que ele foi um advogado de renome. "Ele é neto daquele engenheiro que virou nome de estrada, mas não gosta de comentar", confidencia ela, referindo-se ao engenheiro Régis Bittencourt. "Sobrinho-neto", corrige ele.
Décadas depois, o casal mudou-se para Tatuí, onde o filho já vivia. Há dez anos, Maria conheceu a feirante Ana Alice Soares, de 73 anos, que se tornou uma espécie de cuidadora voluntária do casal. Foi ela quem descobriu que algo incomodava a amiga. "Ela disse que o filho ficava chateado por eles não serem casados."
Ana Alice então ajudou o casal. "Levei dois anos para conseguir toda a documentação, mas valeu a pena."
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo