Por Moniele Nogueira, Maíra Fernandes, TV TEM
Ao menos 30 toneladas de plástico, papelão, vidro e latinhas deixam de ser recicladas e vão para o aterro sanitário — Foto: Reprodução/TV TEM |
17/05/2024 | O setor de reciclagem enfrenta uma crise em Sorocaba (SP). De todo o lixo recolhido na cidade, apenas 2% são reciclados. Ao menos 30 toneladas de plástico, papelão, vidro e latinhas deixam de ser recicladas e vão para o aterro sanitário. A falta de políticas públicas e a queda brusca no valor pago pelas embalagens afastaram os catadores de recicláveis.
O levantamento foi feito pela TV TEM para mostrar a situação enfrentada pelo setor no Dia Mundial da Reciclagem, celebrado nesta sexta-feira (17).
A prefeitura informou que vai implantar um novo sistema de coleta de materiais recicláveis para atender a cidade toda e que está na fase de contratação da empresa para o serviço.
A renda adquirida por meio dos reciclados é o que pode oferecer uma qualidade de vida para diversos moradores da cidade, como é o caso da catadora Regis Selene Muczinsk, que criou os filhos com o dinheiro conquistado na profissão.
"A quantidade de gente que trabalha com nós aqui, acho que, se é importante para mim, é importante para eles também. A renda ajuda bastante, terminei de construir a minha casa, o meu filho comprou um lote [terreno] só com isso que o povo fala que é lixo. Criei os meus filhos, agora todos estão trabalhando e tenho três netos", diz.
Regis Selene Muczinsk conta que criou os filhos com o dinheiro conquistado na profissão — Foto: Reprodução/TV TEM |
Outras histórias como a de Regis poderiam ser contadas, mas a crise no setor as prejudicou. Conforme apurado pela reportagem, muitos fatores interferem no ciclo de cuidado da natureza e geração de renda, como o valor pago pelo material, por exemplo. Em pouco mais de um ano, o preço médio dos produtos caiu 60%.
O papelão está entre os mais desvalorizados. No começo de 2023, o quilo custava R$ 1,50. Agora, é vendido a R$ 0,30. A latinha, que era comercializada a R$ 12 o quilo, caiu pela metade e agora sai por R$ 6. Já a caixinha de leite de R$ 0,30 agora tem o quilo vendido por apenas R$ 0,08.
"Antes a gente trabalhava com uma quantidade de 40, 60 pessoas na cooperativa. Com a queda brusca de um ano e cinco meses do material, que caiu muito o valor, a gente não está conseguindo sobreviver. É por esse motivo que as pessoas estão saindo e tentando procurar um lugar que seja registrado ou que esteja pagando um pouco mais", relata Áurea Aparecida Bueno, presidente da Cooperativa de Reciclagem de Sorocaba (Coreso).
Ciclo de reciclagem prejudicado
O trabalho é essencial para a natureza e uma ajuda valiosa no orçamento familiar. Mas, além do baixo retorno do mercado, as cooperativas de Sorocaba não são pagas para fazer o trabalho. A Coreso, que existe há duas décadas, afirma que recebe ajuda da prefeitura apenas com caminhões para a coleta.
"Se nós fôssemos contratados pela prefeitura, recebendo os nossos serviços prestados no município, nós não teríamos tantas pessoas saindo da cooperativa, porque seria uma ajuda a mais para pagar energia, água, todos os gastos que a gente tem, e ainda ter um ganho melhor na cooperativa. Teríamos mais famílias trabalhando", afirma Áurea.
Na sede da Coreso, os reflexos da crise podem ser vistos no número de pessoas que trabalham no local. De 14 caiu para nove pessoas que participam da triagem, que consiste em separar o plástico, papelão, caixinha de leite e alumínio com a ajuda de uma esteira.
De 14 caiu para nove pessoas que participam da triagem na cooperativa — Foto: Reprodução/TV TEM |
Se o ciclo da reciclagem não flui, muita coisa fica para trás. Antes, a Coreso conseguia vender para a indústria cerca de 140 toneladas de materiais. Agora são, em média, 110 toneladas. Ao menos 30 toneladas de plástico, papelão, vidro e latinhas deixam de ser recicladas e vão para o aterro sanitário.
A reciclagem em Sorocaba, que abrange apenas 2% do total de resíduos que são produzidos diariamente, caiu ainda mais. Janete Eles, que mora no bairro Vila Hortência, afirma que o caminhão de coleta de reciclagem não passa mais na porta da casa dela. Por conta disso, passou a levar o material diretamente na cooperativa.
"A gente tem que fazer o que pode e o que deve ser feito. Faço questão e o pouco que eu faço para colaborar com a natureza e com tudo, porque, se não acontecer isso, aonde que vai parar com tanto reciclado, com tanta coisa que vai virar lixo e não vai ser aproveitado? A gente tem que fazer a parte da gente", afirma.
Situações semelhante em outra cooperativa
A cooperativa Coopervida, localizada no bairro Genebra, também vive uma situação delicada. O grupo afirma não ter apoio do poder público, nem com caminhões.
A cooperativa nasceu de uma parceria entre o Centro de Estudos e Apoio ao Desenvolvimento, Emprego e Cidadania (Ceadec) e a Paróquia Nossa Senhora do Povo, em Brigadeiro Tobias.
Cooperativa faz a coleta do material que pode ser reciclado em 11 mil casas de Sorocaba — Foto: Reprodução/TV TEM |
O objetivo é gerar renda aos moradores da região, mas com a indústria pagando tão pouco pelos itens e os gatos para a realização do trabalho cada vez mais altos, o que sobra no fim do mês é muito pouco. Segundo a presidente da cooperativa, Patrícia de Sene, os catadores não conseguem tirar nem um salário mínimo no mês.
"A gente tem o galpão que é cedido pelo Ceadec, tem um caminhão, só qu o que acontece: o custo do material está tão baixo para a venda que não paga a água, não paga a energia, [...] você tirando todas essas despesas da receita, a receita fica baixa. Hoje os catadores não conseguem tirar nem um salário mínimo por mês. Não conseguem atingir um salário, porque a gente recolhe previdência", explica.
A cooperativa faz a coleta do material que pode ser reciclado em 11 mil casas de Sorocaba. Atualmente, ela tira da natureza pelo menos 60 toneladas de material que pode ser reciclado. Este número poderia ser até cinco vezes maior se o espaço estivesse operando na capacidade máxima, mas muitas vezes tem que deixar de coletar por não conseguir fazer a triagem.
"A coleta seletiva é um trabalho como qualquer outro. É um agregador de renda, um posto de geração de trabalho. A falta do apoio do poder público, a queda do preço dos materiais recicláveis… é desestimulante para quem está na área. Se houvesse pelo menos o apoio do poder público, você dá uma equilibrada na situação", finaliza Patrícia.
O que diz a prefeitura
Em nota, a Prefeitura de Sorocaba informou que recicla 300 toneladas de materiais por mês, que tem um "acordo de cooperação" com a Coreso e Coopereso, e que o investimento é de R$ 250 mil por mês para a locação de 10 caminhões.
Ainda informou que vai implantar um novo sistema de coleta de materiais recicláveis que vai atender a cidade toda e que está na fase de contratação da empresa para o serviço. Sobre a Coopervida, a prefeitura não respondeu se tem proposta para ajudar o lugar.
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