Clodoaldo Rodrigues (Arquivo DT) |
Clodoaldo Rodrigues Nunes, ou apenas Seu Rodrigues, como nos acostumamos a chamá-lo, foi um desses poucos homens imprescindíveis dos quais falava Brecht. Podemos viver muitos anos sobre a terra, porém dificilmente encontraremos alguém capaz de unir, de forma tão coerente, teoria e ação, como Seu Rodrigues o fazia. Muitos de nós o conhecemos como um mentor, um intelectual, porém é preciso ressaltar que os conhecimentos que adquiria, ele os aplicava sempre à transformação do mundo. Alguns que aqui estão talvez nem o tenham conhecido pessoalmente, mas vieram até aqui pois de alguma forma as ações de Seu Rodrigues os tocaram, chegaram até vocês, e isso é algo que pode dar a dimensão do impacto que a trajetória desse homem teve em nossa cidade, em nossa região, em nosso país.
Rodrigues nasceu no dia 13 de setembro de 1944 na cidade de Ourinhos/SP, e, em 1964, o ano do golpe, ingressou na Universidade de São Paulo, para cursar Física. Fato curioso, mas que é sinal indiscutível de sua inteligência, é que entre os anos de 1964 a 1966, chegou a receber uma bolsa da NASA, realizando pesquisa no Laboratório Pélletron, na USP. Porém, a necessidade urgente de combater a ditadura o levou a ingressar no movimento estudantil, dedicando-se a contribuir para com a formação e politização dos operários em bairros e fábricas, no ABC Paulista e em Osasco. Com o AI-5, em 1968, entramos em uma era sombria de totalitarismo, com prisões políticas e a tortura sistemática. Infelizmente, Seu Rodrigues viria a ser vítima desse regime covarde. Teve sua vida estudantil investigada e, devido a um inquérito instaurado no CRUSP, foi declarado clandestino. De 1969 até 1971, sobreviveu na clandestinidade. Foram muitas as sementes que Rodrigues plantou em vida, e muitas delas se transformaram em magníficas árvores. Uma delas, sem dúvida, vem do trabalho que realizou com os operários do ABC Paulista, ainda na clandestinidade, que contribuíram para a conscientização da classe trabalhadora e que desembocariam, em fins da década de 70, nas greves dos metalúrgicos de São Bernardo, que deu palco ao surgimento da maior liderança política desse país. Entre 1971 até fins de 1972, no entanto, Rodrigues esteve preso nos porões da ditadura. Não podemos medir o tamanho de sua bravura, que resistindo diariamente a todo tipo de crueldade, em quase dois anos de prisão não delatou nenhum de seus companheiros de luta. Porém, a missão que Rodrigues tinha a cumprir em nosso país estava apenas começando. Alguns anos depois, em 1976, mudou-se para Sorocaba, com a esperança de que, lá, diminuiria a perseguição contra ele. Já estava com a vida legalizada e se aplicou a lecionar em cursinhos. Bacharelou-se em Direito na Faculdade de Direito de Sorocaba – FADI, atuando no campo do direito trabalhista, em defesa da classe operária. No processo de abertura política do país, iniciou o trabalho de auxiliar a organização de categorias de trabalhadores. Em 1986, por exemplo, deu início à formação do Sindicato dos Condutores de Sorocaba, politizando e conduzindo as novas lideranças deste setor. Assessorou, também, o Sindicato dos Trabalhadores na Movimentação de Mercadorias, no qual permaneceu por três anos. Já no início dos anos 2000, tornou-se professor da UNISAL de Americana, lecionando Direito do Trabalho e Economia e, alguns anos depois, especializou-se ainda em Economia do Trabalho pela UNICAMP. Foram muitos os sindicatos que Seu Rodrigues trouxe para nossa região, podemos citar o Sindicato das Empregadas e Trabalhadores Domésticos, o Sindicato dos Empregados em Turismo e Hospitalidade de Sorocaba e Região, o Sindicato dos Trabalhadores do Setor Hoteleiro de Sorocaba e Região e o Sindicato dos Transportadores Autônomos de Cargas. Já em fins dos anos 2000, Rodrigues se uniu a um grupo de jovens secundaristas para criar este que hoje é o Movimento Popular Práxis. Para estes jovens, Rodrigues foi um mentor, um amigo, um companheiro. Esse grupo se tornou o maior movimento social organizado de nossa cidade, formando jovens quadros de dirigentes partidários, líderes estudantis, sindicais e elegendo, por fim, o atual Presidente da Câmara de Tatuí.
Num momento tão triste como esse, é consolador pensar que Rodrigues teve, ao menos, a chance de ver esse movimento crescer e, talvez, se orgulhar com as conquistas desses jovens que ele ajudou a formar. É consolador pensar que teve a oportunidade ainda de ver Lula voltar à Presidência, após esses últimos anos tão sombrios que vivemos ultimamente. Espero que isso o tenha ajudado a encontrar a paz.
Conheci Seu Rodrigues em 2010, quando fundávamos o Movimento Popular Práxis. E posso dizer que aprendi muitas coisas com ele. Aprendi, é verdade, muitos conceitos básicos de sociologia, economia, filosofia. Aprendi também, como ele costumava dizer, que um revolucionário nunca deve ser chato. Mas, mais importante do que tudo, aprendi que não é possível que fiquemos indiferentes à fome, à miséria, ao sofrimento humano e a todas as injustiças que existem nesse mundo. Seu Rodrigues trazia dentro de si uma chama transformadora, e se podemos dizer que um pouco dessa chama ainda existe dentro de nós, é porque, Rodrigues, você cumpriu com excelência a sua missão.
Conheci Seu Rodrigues em 2010, quando fundávamos o Movimento Popular Práxis. E posso dizer que aprendi muitas coisas com ele. Aprendi, é verdade, muitos conceitos básicos de sociologia, economia, filosofia. Aprendi também, como ele costumava dizer, que um revolucionário nunca deve ser chato. Mas, mais importante do que tudo, aprendi que não é possível que fiquemos indiferentes à fome, à miséria, ao sofrimento humano e a todas as injustiças que existem nesse mundo. Seu Rodrigues trazia dentro de si uma chama transformadora, e se podemos dizer que um pouco dessa chama ainda existe dentro de nós, é porque, Rodrigues, você cumpriu com excelência a sua missão.
(Discurso proferido por Lucas Teles no funeral de Clodoaldo Rodrigues Nunes, no dia 04/07/2023, no Cemitério Cristo Rei, em Tatuí, onde foi sepultado.)
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