A moça só queria pensar
A felicidade entra clandestina
pelas frestas
janela sem cortina
escancara a vida
… que quer sol
Distrai a angústia
Vence o enredo anunciado
exaustivamente
em palavras comprometidas
A cada instante
uma situação nova
narra o pensamento
Existe uma pressa calma
Hora a hora
A lida preenche o vazio
da alma
Ansia pelo fazer
Para não enlouquecer
ângulo agudo
da mulher que pensa
Unhas sem fazer
Viver é artesanal
A via crucis do corpo
A mulher que pensa
Lava o medo
no sabão em pó
arrisca uma receita nova
dóem-lhe os pés
e todos estão surdos
queima o arroz
salga demais o feijão
Um raio de sol
Invade o espaço
Puro amor
Ela não vê
Na esquina da sala
As crianças brincam de brigar
Cai a conexão
da manhã on line
Queria pintar
um quadro de vermelho intenso
remexe as tintas
escolhe o cinza
quase preto
Não tem forças
Retraça o caminho
do andar de baixo
ao andar de cima
Tem pilhas de roupas
para guardar
Ela só queria pensar
É um outro mundo
Entre as quatro paredes
No espelho
não se reconhece
Se educa
Para o caminho
no sentido oposto
Resiste
Fala sozinha
Mexe o Nescau para o filho
Instantâneo
E, quando achou que poderia...
Ler
O celular
trilhões de interrupções
a hora já passou
Frustra-se
Não se reconhece
Nesta vida que não se conta
Sob o pano de prato
500 copos pra lavar
que se multiplicam
Até a noite
milhões de copos
Na caneca o bigode de Dali
lembrança de algum museu
Remota imagem
trânsito livre pelo mundo
O imperativo pessoal
antes de mais nada
Seria o banho demorado
Alguém chama
Esqueceu a toalha
O sabonete está no fim
As coisas exigem
Vida !
E ela só queria pensar
(Cristina Siqueira)
Nenhum comentário:
Postar um comentário