segunda-feira, 19 de agosto de 2019

artigo | Alexandre de Moraes

OPINIÃO

30 anos de Celso de Mello no Supremo: um exemplo a ser seguido


Os 30 anos da promulgação da Constituição de 1988 mereceram grandes comemorações, por constituírem o maior período de estabilidade democracia e respeito ao Estado de Direito de nossa história republicana, com o constante avanço na efetivação dos direitos fundamentais e a ampliação segura do livre exercício da cidadania, permitindo o desenvolvimento da cultura republicana, da independência do Poder Judiciário e do pluralismo de ideias e liberdade de expressão como valores estruturantes do sistema democrático.

Nesse período, destacaram-se a independência, firmeza, sabedoria e humildade de um dos maiores magistrados da história brasileira, que completando 30 anos de atividade no Supremo Tribunal Federal, foi um dos principais construtores do real significado do texto constitucional.

José Celso de Mello Filho, paulista de Tatuí e formado nas tradicionais Arcadas da Faculdade do Largo de São Francisco, em 17 de agosto de 2019, alcançou, no Supremo Tribunal Federal, a mesma idade da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; sendo, no período republicano, o único Ministro da Corte a completar 30 anos no exercício do cargo; passando a fazer parte de um seletíssimo e histórico grupo de membros de Cortes Supremas; que, no Brasil, era composto somente por José Paulo Figueiroa Nabuco de Araújo, do Supremo Tribunal de Justiça, que permaneceu no cargo pouco mais de 31 anos durante o Império e, nos Estados Unidos da América — onde inexiste limite de idade para aposentadoria – por somente 16 membros da Corte Suprema Norte-americana, entre eles John Marshall, William O. Douglas, John Paul Stevens, Hugo Black, William Brennan, William Rehnquist, Antony Kennedy e Antonin Scalia.

Em seu Jubileu de Porcelana (20 anos de Supremo Tribunal Federal), em 2009, tive a honra de homenagear o ilustre ministro José Celso de Mello Filho em artigo publicado no site de nossa Corte Suprema. Escrevi que, parafraseando o professor da Universidade de Grenoble, Jean Marcou, ao afirmar ser “o século XX... o século dos tribunais constitucionais” poderia dizer que os últimos 20 anos de Supremo Tribunal Federal foram os anos de José Celso de Mello Filho.

Faço questão de completar: os últimos 30 anos de Supremo Tribunal Federal foram os anos de José Celso de Mello Filho.

Com mais uma década de brilhante atuação, ao comemorarmos suas “Bodas de Pérola”, não é demasiado afirmar que, durante essa prodigiosa jornada de 30 anos, tornou-se imprescindível a todos os intérpretes analisarem o texto constitucional pelas lentes do Decano do Supremo Tribunal Federal e obrigatório aos agentes públicos observarem suas lições no sentido do fortalecimento do Estado Democrático de Direito, do aperfeiçoamento de mecanismos de controles institucionais e do combate a corrupção, em defesa da honestidade, moralidade e probidade na administração.

Os mais importantes adjetivos da língua portuguesa, ao nos referirmos ao Ministro Celso de Mello, tornam-se “substantivos”, pois se trata de um dos mais completos e respeitáveis homens públicos da história do Brasil; sendo um magistrado exemplar, brilhante jurista e incansável estudioso na incessante busca da consagração da verdadeira liberdade para todos os brasileiros, no sentido defendido por Martin Luther King, em um de seus mais belos ‘Sermões’ – “O Nascimento de uma Nova Nação”, quando afirmou que cercear as liberdades públicas de uma pessoa “é tirar-lhe a essência de sua humanidade. Tirar-lhe a liberdade é roubar-lhe algo da imagem de Deus”.

Nessas três décadas de atividade judicante, a influência do Ministro Celso de Mello para a concretização de um efetivo e justo Estado Democrático de Direito foi essencial, tanto no campo das definições de nosso controle de constitucionalidade, quanto na proteção dos direitos humanos fundamentais, dos ideais republicanos e do combate à corrupção. A todos, ensinou o Decano do STF que “o propósito maior do Supremo Tribunal Federal é o de servir, com integridade e respeito, ao que proclamam a Constituição e as leis da República” (Sessão Plenária de 21/8/2013), pois a “Corte Suprema não se curva a pressões” e “não admite os excessos e abusos que emanam de qualquer esfera dos poderes” (ADO 26); combatendo severamente o ato de corrupção, por ser “um gesto de perversão da ética do poder e da ordem jurídica, cuja observância se impõe a todos os cidadãos desta República que não tolera o poder que corrompe nem admite o poder que se deixa corromper” (AP 470); uma vez que, existe “o direito do cidadão ao governo honesto” (Inq. 3983).

As palavras dedicadas ao primeiro-ministro Lloyd George por Winston Churchill, em sua memorável obra (“Grandes Homens do Meu tempo”), são integralmente aplicadas ao Ministro Celso de Mello: “a história dirá que possui, mais do que qualquer homem de seu tempo, as qualidades requeridas de um governante: profunda habilidade política e pessoal; espantosa energia vital; firme e obstinada perseverança e audácia”.

Parabenizo o amigo Celso de Mello, pois sua atuação em nossa Corte Suprema, com coragem, dedicação, seriedade e sincero amor à causa pública, tornou-se modelo essencial e obrigatório a ser seguido por todos aqueles voltados para um único objetivo: o bem comum.

Alexandre de Moraes é ministro do Supremo Tribunal Federal e professor livre-docente em Direito Constitucional pela USP e pelo Mackenzie.

Revista Consultor Jurídico, 18 de agosto de 2019, 10h34

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