O empoeirado relógio quase obsoleto
Tic-tac, tic-tac, tic-tac... Assim se conservava o tímido relógio de ponteiro pendurado em uma parede, jazendo como um enfeite absorvedor de pó, mostrando a sua única intimidade: as horas, os minutos e os segundos. Seu único fiel amigo: o pó. Seu único destino: o tempo.
Na sua simplicidade mecânica, não foi afetado pelo impulso tecnológico de adiantar-lhe uma hora. De roubar de ti uma hora de labor. Os relógios modernos, em rede, todos foram adiantados por uma hora no nefasto equívoco do horário de verão que veio mais cedo equivocadamente, causando tremendas confusões no cotidiano: João que acordou mais cedo, Maria que passou o café precocemente, Tião que começou a construir adiantado, Joana que teve que requentar a comida, o galo que cantou antes da hora... Isto é, roubaram uma hora de sono do povo, uma preciosa hora de seus sonhos. Até nisso roubam o pobre povo! Até o seu mísero horário de sono.
Vejam como as civilizações são manipuladas pela robotização proveniente da tecnologia. A tecnologia nos orienta e nos comanda sem ao menos percebermos. A necessidade em excesso de estar conectado é enorme. E quando não estamos, os nossos neurônios passam a clamar, rogar e chamar fervorosamente pela saciedade desse vício, atribuído como uma “necessidade” da vida moderna. Como peixes, estamos aprisionados a essa enorme rede que ao mesmo tempo que nos dá a liberdade, nos atribui a prisão. Uma prisão sem grades que amedronta o nosso intelecto. Bendito é aquele que vive longe dessa rede, um peixe livre que pode explorar esse mar que é a vida, a vida real e concreta, que hoje parece mais artificializada do que a própria virtualidade.
Enquanto isso, o relógio velho e singelo continuou em seu tempo, sem pressa e ansiedade, independente dos demais. Simplesmente livre. Não mudou, apenas continuou seu rumo concêntrico pronunciando sua língua monossilábica: tic-tac, tic-tac, tic-tac...
A.M.O.R.
(Ana Moraes de Oliveira Rosa)
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