Do jornal O Progresso de Tatuí, com poucas modificações
O Voa São Paulo é um projeto de incentivo fiscal desenvolvido pela Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude do Estado de São Paulo. Ele segue os parâmetros da “Lei do Esporte”, do Governo Federal, que patrocina atividades esportivas em todas as modalidades existentes no Brasil.
Por meio do projeto “Santos Dumont”, em 2010, a FBVV recebeu pela primeira vez recursos federais para viabilizar bolsas de estudo. Na época, o aeroclube local também teve participação, ministrando aulas para formação de 11 aerovelistas.
No caso do projeto estadual, o governo autoriza empresas a direcionarem parte do valor devido de ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) para a formação esportiva. No total, o Voa São Paulo prevê a formação de 70 aerovelistas, num investimento de R$ 987.992. Por intermédio da federação, o aeroclube local foi selecionado para receber os 13 primeiros bolsistas.
De acordo com o piloto instrutor Cesar Augustus Mazzoni, o Aeroclube de Tatuí mantém o curso regular de instrução para voo com planadores e já formou mais de 500 pilotos aerovelistas. “Alguns deles, hoje, trabalham como pilotos profissionais em importantes companhias aéreas e outros até mesmo na aviação militar”, disse Mazzoni.
Durante seis sábados, ele e outros instrutores tatuianos ministram aulas para os bolsistas. No período da manhã, acontecem as aulas teóricas, divididas em cinco matérias obrigatórias: teoria de voo, conhecimentos técnicos, navegação aérea, regulamentos de tráfego aéreo e meteorologia. Além disso, há aulas optativas sobre segurança de voo e procedimentos de emergência.
Durante a tarde, os bolsistas são encaminhados para a pista de pouso de decolagem, onde realizam atividades práticas de voo. “Assim, eles vão estar se integrando com a rotina dos outros alunos que o aeroclube tem em sua grade curricular”, comentou o piloto instrutor.
O planador é uma aeronave sem motor. No voo a vela, um rebocador (aeronave motorizada) conduz o planador até uma altura previamente determinada. Lá, acontece o desligamento da corda e o planador se mantém em voo independente, graças à configuração aerodinâmica semelhante à do avião, que aproveita correntes atmosféricas.
No interior do planador, há espaço para duas pessoas. Nas aulas práticas de aerovelismo, um dos acentos é obrigatoriamente ocupado pelo instrutor. Os comandos repetidos permitem que os dois ocupantes pilotem a aeronave. As técnicas de pilotagem são semelhantes às de um avião motorizado. “O planador tem todos os recursos de um avião, exceto o motor”, explicou Mazzoni.
Em competições, os aerovelistas procuram cumprir metas previamente estabelecidas no regulamento. Em uma das modalidades mais simples do esporte, o atleta precisa manter-se no ar por, no mínimo, cinco horas, subir a até 1.600 metros (manobra realizada com a ajuda de correntes de ar quente) e percorrer mais de 50 quilômetros em linha reta.
Entre os bolsistas selecionados para o projeto, está o técnico em informática Kiril Araújo, 50, da cidade de São Paulo. Iniciante na prática do aerovelismo, ele afirma que conhecia o esporte apenas como expectador, devido à preferência que tem por assuntos de aviação e aeronáutica.
Motivado pela vontade de praticar esporte nas alturas, na década de 80, ele passou a praticar voos com asa-delta. “Eu encontrei uma turma que voava, fiz um curso e comecei a voar com eles. Mas sempre pesquisava sobre esportes mais avançados, como o aerovelismo, porque o planador é muito mais sofisticado”, afirmou o bolsista.
Por meio da indicação de amigos, ele soube das vagas para participar do projeto Voa São Paulo. Depois de se inscrever, Araújo fez a prova escrita e o voo de avaliação e ficou entre os 13 selecionados. Para ele, a convivência anterior com esportes aéreos foi importante para a classificação. “A maioria das pessoas que começam a fazer este tipo de esporte já tem isso no sangue”, afirmou ele.
Mesmo não sendo praticante de nenhum esporte aéreo, o auditor tatuiano Marcelo Vinicius Nunes de Almeida, 21, também se valeu do conhecimento prévio para ser um dos 13 bolsistas. “Eu tinha contato com algumas pessoas do aeroclube e falei para elas do meu interesse de voar. Vim até a pista algumas vezes, mas nunca havia praticado”, disse ele, que também passou nos testes e está entre os bolsistas do Voa São Paulo.
Para os iniciantes, as aulas práticas e seus diversos voos dão a impressão de que o curso será “repleto de emoções”. Entretanto, para se tornar um aerovelista e ter condições de fazer os primeiros voos solo, é preciso passar por muitas horas de estudo. Isso para garantir que o esporte seja praticado da forma adequada, com a segurança necessária. Os instrutores garantem que os voos são extremamente seguros.
“Toda a atividade humana envolve algum tipo de risco. O que a gente precisa fazer no aerovelismo é estudar bastante para minimizar o máximo possível estes riscos”, afirmou o piloto instrutor Sérgio Dazzi. Como o planador não conta com o recurso do motor, no momento do pouso o piloto precisa ter certeza das ações que pretende realizar.
“O piloto não pode se dar ao luxo de errar. Quando ele estiver voando, tem que saber que uma tentativa de pouso é definitiva. Como não há motor, se houver algum problema, não existirá a possibilidade de arremeter e continuar o voo”, afirmou Dazzi.
O presidente da FBVV também ressaltou a importância do estudo e do conhecimento técnico para o sucesso do aerovelista. Para ele, a vontade de estudar é uma das principais características do atleta que pratica aerovelismo. “Isto faz com que o perfil deste competidor seja bastante diferenciado, porque é um esporte que realmente envolve necessidade de se ter muito conhecimento”, afirmou Torres.
De acordo com ele, os outros itens importantes para o sucesso de um aerovelista são a habilidade e o treinamento. “A habilidade é algo inato. Comparando com a Fórmula 1, a gente sabe que existem muitos ‘Ayrtons Sennas’ espalhados pelo mundo. No aerovelismo, acontece uma coisa semelhante, pois há pessoas que vêm com uma habilidade excepcional de berço”, disse o presidente do FBVV.
Na avaliação de Torres, o terceiro item, o treinamento, é o mais simples, mas não por isto mais rápido de ser obtido. “Se conseguir juntar o conhecimento e a habilidade, o treinamento ele adquire ao longo dos anos. Um bom piloto leva anos para despontar, e o próprio treinamento é bastante demorado. Praticando, competindo, ele vai desenvolver a sua capacidade esportiva aos poucos”.
EVOLUÇÃO
Para o presidente da Federação Brasileira de Voo a Vela, os investimentos das autoridades para a formação gratuita de atletas aerovelistas representa vitória para os praticantes do esporte no Brasil. “É uma nova era que se inicia no Brasil para o voo a vela e, quiçá, para outras modalidades esportivas que nunca tiveram condições de ser bem desenvolvidas neste país”, afirmou Torres.
Embora seja um dos esportes subordinados ao Comitê Olímpico Brasileiro, o aerovelismo não tem participação nas Olimpíadas. Torres afirma que, no Brasil, o esporte com planadores ainda é pouco desenvolvido e desconhecido da maioria das pessoas.
O principal objetivo da FBVV, segundo ele, é melhorar a presença deste esporte no país. “Só para comparar, na Alemanha, são mais de 45 mil pilotos. Aqui, somos em torno de apenas 600, e este número tem que ser aumentado”, disse o presidente.
Torres reconhece que um dos principais empecilhos para a popularização do esporte é o custo relativamente alto para praticá-lo. “Realmente, a prática do aerovelismo envolve despesas mais significativos que a maioria dos outros esportes. A gente compara ao iatismo e ao hipismo”, comentou. Justamente por conta dos gastos elevados é que o presidente comemora os incentivos fiscais. “É a primeira vez que temos experiências neste sentido no Brasil”, afirmou.
Outro fator que afasta muitos praticantes, na avaliação de Torres, é o medo e o receio gerado pela pratica de um esporte “tão diferente”. Para ele, esta peculiaridade típica dos brasileiros é fruto da falta de conhecimento e familiaridade com a aviação.
“Os jovens brasileiros não têm familiaridade com a aviação. Diferente do que acontece principalmente na Europa, onde as crianças têm contato com pilotos desde muito cedo. Lá, elas frequentam pistas e aprendem que este esporte é muito seguro. Aqui no Brasil, a gente ainda está fazendo este trabalho”, observou.
De acordo com Torres, uma iniciativa importante neste sentido aconteceu em Tatuí no ano passado, quando um grupo de 80 jovens da cidade de Sorocaba conheceu o aeroclube local. Os visitantes tinham idade entre 6 e 16 anos e tiveram um “aprendizado básico” sobre voo a vela.
“É exatamente esta a ideia: fazer uma aproximação enquanto a pessoa é jovem para que ela não cresça com temores infundados de que voar é inseguro. Não, o avião é feito para voar, e ele voa, e voa muito bem”, afirmou Torres.
De acordo com ele, a finalidade do projeto Voa São Paulo é popularizar o esporte e formar atletas na condição de pilotos esportistas. “As aulas se destinam a identificar valores para desenvolvimento do esporte no Brasil”, disse o presidente. A tendência, segundo ele, é de que os novos pilotos se transformem em atletas competidores e que eles melhorem a representação do Brasil nas competições internacionais.
Por outro lado, mesmo não tendo o objetivo específico de formar pessoas para aviação, os pilotos de planadores podem ter facilidade para iniciar carreira na aviação profissional. “Neste curso, eles receberão um brevê de piloto. Bastando que eles queiram progredir na carreira profissional, eles podem se valer deste brevê e partir para especializações”, explicou Torres.
De acordo com ele, obter o brevê de piloto privado e comercial é mais fácil para quem já é piloto planador. “Temos em Tatuí vários exemplos de grandes pilotos, profissionais de renome mundial, que pilotam os maiores aviões que existem no mundo e começaram voando em planador”, relatou o presidente da FBVV.
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